Od donos do Poder adiam mudanças no Rótulo e prejudicam e podem até matrar alergênicos


Surpresa em cima da hora

Às vésperas do fim do prazo dado pela Anvisa em julho do ano passado, indústria de alimentos ignora apelos de sociedade civil e pede prorrogação para adequação de rótulos de alérgenos





Em junho do ano passado, após um amplo debate com diversos setores da sociedade civil – incluindo o movimento Põe no Rótulo, representado por famílias de alérgicos alimentares – a Anvisa votou e aprovou, por unanimidade, a proposta de regulamentação da rotulagem de alergênicos (RDC nº 26/2015). O texto foi publicado no Diário Oficial no dia 3 de julho de 2015 e as indústrias têm um prazo de 12 meses, ou seja, julho deste ano, para modificar os rótulos dos alimentos e também de bebidas. Seria motivo de comemoração para a população, afinal, isso é direito a informação, mas a surpresa nada agradável chegou em cima da hora: surpreendentemente, foi pedida a ampliação deste prazo por parte das empresas alimentícias. Entre as alegações, a questão do custo e a complexidade da cadeia produtiva, inclusive em relação aos suprimentos.

A pauta do Põe no Rótulo tem sido endossada por diversas instituições, que, recentemente, assinaram uma carta aberta (em anexo neste email) reconhecendo a importância do movimento e reforçando a necessidade da manutenção do prazo previsto na RDC nº 26/15. Entre elas: ASBAI, Instituto Alana, Akatu, IDEC, Instituto Pro Bono e ACT+.

O que causa estranheza em relação a esse pedido de adiamento é que muitas indústrias já se anteciparam ao prazo estabelecido pela Anvisa e estão rotulando corretamente. A grande quantidade de rótulos de produtos industrializados já de acordo com a norma confirma que é perfeitamente possível atender ao prazo de 12 meses que está previsto na legislação – alerta a advogada Fernanda Mainier Hack, uma das coordenadoras do movimento. 

Um dos responsáveis pela pressão social que motivou a Anvisa a propor essa regulamentação, o Põe no Rótulo – um movimento da sociedade civil organizada –  foi criado em fevereiro de 2014 e pediu publicamente, desde então, para que a norma da rotulagem de alergênicos no Brasil fosse criada. A empatia da sociedade com a iniciativa foi imediata: o apoio de famosos foi grande e a fanpage da campanha hoje tem mais de 117 mil curtidores.

Apesar de toda essa luta do movimento, que esteve presente na votação da proposta de regulamentação de rotulagem de alergênicos, as empresas ignoram o apelo da sociedade civil: sobre a ampliação do prazo, chegam a cogitar até mais 18 meses de adiamento. Pensando em crianças alérgicas com um ano de idade, isso é quase o triplo do que já viveram sem informações precisas nos rótulos. 

 O uso de nomenclatura técnica ou em outra língua, pouco acessível ao consumidor
brasileiro, como caseinato, ghee, whey, albumina, lisozima, entre outros, é responsável por uma série de reações adversas que poderiam ser evitadas se os rótulos já estivessem adequados à RDC nº 26/15. Falta respeito ao consumidor, cuidado em relação à segurança alimentar e responsabilidade social – alerta Mariana Claudino, jornalista, estudante de nutrição e coordenadora do Põe no Rótulo.

Para a equipe do movimento, ampliar o prazo é ignorar um direito da sociedade: saber o que está comendo.

 A necessidade do destaque dos alergênicos nos rótulos é um tema que o setor produtivo brasileiro acompanha há quase duas décadas, não havendo nenhum argumento relevante ou fato novo que pudesse justificar o pleito de ampliação do prazo proposto pela norma. Afinal, o dever de informar de maneira clara e compreensível decorre da Constituição Federal e está expressamente previsto no Código de Defesa do Consumidor – defende a advogada Cecilia Cury, doutora em Direito Constitucional pela PUC/SP, fundadora e coordenadora do Põe no Rótulo.



VOCÊ SABIA?

* O Põe no Rótulo tem acompanhado as mudanças nos corredores dos mercados: a cada dia, novos produtos aparecem ostentando rótulos que já estão adequados à RDC nº 26/15; a cada semana, novas empresas adaptam os rótulos de seus produtos, ampliando a margem de segurança dos consumidores. Como consequência disso, temos tido notícias de inúmeras pessoas que finalmente entenderam a razão de ter tido uma reação alérgica após o consumo de produtos que, na época, não informavam o risco de poder conter alergênicos;

* A prevalência das alergias alimentares vem crescendo ao redor do mundo e, no Brasil, estima-se que afeta entre 6 e 8% das crianças e cerca de 2% da população adulta. Os estudos indicam que as alergias estão atingindo mais pessoas, ficando mais persistentes e com reações mais graves;

* Os SACs das indústrias não funcionam nos fins de semana e não atendem a ligações de telefones celulares: como faz então uma pessoa que deseja saber sobre um produto antes de comprá-lo – e, ainda, em um sábado ou domingo?

* Quando questionados pelos consumidores, diversos SACs violam gritantemente o direito a informação na medida em que se limitam a orientar o consumidor a ler o rótulo (onde nem sempre se tem a informação sobre risco de contaminação cruzada) e deixam de responder a questão com a justificativa de que a empresa ainda está aguardando o fim do prazo de adequação.

* O tema da rotulagem de alergênicos já é objeto de regulamentação há anos, desde 1999, pelo Codex Alimentarius, seguido por diversos países que já tratam de regras de rotulagem de alérgenos em alimentos há quase duas décadas;

* A campanha #poenorotulo tem o apoio de pessoas públicas como
Fatima Bernardes, Juliana Paes, Natalia Thimberg, Tiago Leifert, Adriana Esteves, Mateus Solano, Reynaldo Gianecchini, Marcos Palmeira, Paula Toller, Ziraldo, Zico, Alexandre Nero e Dan Stulbach, entre muitos outros.

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