Por Prof. Dr. Mario Louzã, médico psiquiatra, doutor em Medicina pela
Universidade de Würzburg, Alemanha, e Membro Filiado do Instituto de
Psicanálise da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo
Muitas dúvidas e até informações incorretas cercam o Transtorno de
Déficit de Atenção e Hiperatividade – TDAH. O transtorno foi descrito
pela primeira vez em crianças, na literatura médica, em 1902, por um
pediatra inglês. Trata-se de uma doença que conhecemos há um século,
mas até hoje há dificuldade em seu diagnóstico e tratamento. Ao longo
das últimas décadas, ela foi incluída na classificação internacional
das doenças da Organização Mundial da Saúde e no manual de diagnóstico
da associação psiquiátrica americana, ambos com critérios detalhados
para considerar que alguém tenha o TDAH.
Embora as causas do TDAH sejam ainda desconhecidas, admite-se que resulta
de uma alteração do neurodesenvolvimento. Seu diagnóstico é feito
através de uma avaliação clínica bem minuciosa com um profissional
médico habilitado para que não haja dúvidas sobre o diagnóstico. Se
não houver dúvidas, o tratamento do TDAH pode envolver abordagens
psicológica, psicopedagógica e medicamentosa.
Na maioria dos casos, o tratamento do TDAH é feito com medicações, os
psicoestimulantes, estimulantes do sistema nervoso central. São
medicamentos que foram criados em laboratórios por volta da década de 40
a 50, ou seja, eles têm, pelo menos, 60 anos de uso, o que nos proporciona
uma boa experiência sobre estas medicações, seja reações e efeitos
colaterais como também benefícios. Isso significa que o tratamento
medicamentoso é bastante seguro e, em geral, tem resultados bastante
satisfatórios.
O TDAH se manifesta na infância e o Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders
– DSM), lista dezoito sintomas que nos indicam o diagnóstico:
a. Frequentemente, não presta atenção em detalhes ou comete erros por
descuido em tarefas escolares, no trabalho ou durante outras atividades
b. Frequentemente, tem dificuldade de manter a atenção em tarefas ou
atividades lúdicas, como conversas ou leituras prolongadas
c. Frequentemente, parece não escutar quando alguém lhe dirige a palavra
diretamente, parece estar com a cabeça longe, mesmo na ausência de
qualquer distração óbvia
d. Frequentemente, não segue instruções até o fim e não consegue
terminar trabalhos escolares, tarefas ou deveres no local de trabalho.
Costuma começar as tarefas, mas rapidamente perde o foco e o rumo
e. Frequentemente, tem dificuldade para gerenciar tarefas sequenciais;
dificuldade em manter materiais e objetos pessoais em ordem; trabalho
desorganizado e desleixado; mau gerenciamento do tempo; dificuldade em
cumprir prazos
f. Frequentemente, evita, não gosta ou reluta em se envolver em tarefas
que exijam esforço mental prolongado, como trabalhos escolares ou lições
de casa. Em caso de adolescentes mais velhos e adultos, a dificuldade está
no preparo de relatórios, preenchimento de formulários ou revisão de
trabalhos longos
g. Frequentemente, perde coisas necessárias para tarefas ou atividades,
como materiais escolares, lápis, livros, instrumentos, carteiras, chaves,
documentos, óculos ou celular
h. Com frequência, é facilmente distraído por estímulos externos (para
adolescentes mais velhos e adultos, pode incluir pensamentos não
relacionados)
i. Com frequência, é esquecido em relação a atividades cotidianas, como
realizar tarefas e obrigações. No caso de adolescentes e adultos, o
desafio está em retornar ligações, pagar contas ou manter horários
agendados
2. Hiperatividade e impulsividade: seis (ou mais) dos seguintes sintomas
persistem por, pelo menos, seis meses em um grau que é inconsistente com o
nível do desenvolvimento e têm impacto negativo diretamente nas
atividades sociais e acadêmicas/profissionais:
Nota: Os sintomas não são apenas uma manifestação de comportamento
opositor, desafio, hostilidade ou dificuldade para compreender tarefas ou
instruções. Para adolescentes mais velhos e adultos (17 anos ou mais),
pelo menos cinco sintomas são necessários:
a. Frequentemente, remexe ou batuca as mãos ou os pés ou se contorce na
cadeira.
b. Frequentemente, levanta da cadeira em situações em que se espera que
permaneça sentado
c. Frequentemente, corre ou sobe nas coisas em situações em que isso é
inapropriado. (Em adolescentes ou adultos, pode se limitar a sensações de
inquietude)
d. Com frequência, é incapaz de brincar ou se envolver em atividades de
lazer calmamente
e. Com frequência, “não para”, agindo como se estivesse “com o
motor ligado”. A pessoa não consegue ou se sente desconfortável em
ficar parado por muito tempo, como em restaurantes ou reuniões
f. Frequentemente, fala demais
g. Frequentemente, deixa escapar uma resposta antes que a pergunta tenha
sido concluída
h. Frequentemente, tem dificuldade para esperar a sua vez
i. Frequentemente, interrompe ou se intromete nas conversas, em jogos ou em
atividades. A pessoa pode começar a usar as coisas de outras sem pedir ou
receber permissão. Com adolescentes e adultos, pode intrometer-se em ou
assumir o controle sobre o que outros estão fazendo.
Estes sintomas devem estar presentes o tempo todo, em qualquer ambiente, e
precisam causar algum tipo de prejuízo funcional à pessoa, como baixo
rendimento escolar ou no trabalho.
Uma vez feito o diagnóstico na criança, o ideal é realizar um
acompanhamento médico contínuo, que irá avaliar se o tratamento deve ser
medicamentoso ou psicoterápico/psicopedagógico. Conforme o paciente
cresce, a tendência é de que o déficit de atenção, a hiperatividade e
a impulsividade diminuam, chegando até a desaparecer na idade adulta em
cerca de metade das crianças.
Em muitos casos os sintomas persistem na idade adulta, também levando a
prejuízos funcionais vários. O reconhecimento de que o adulto pode ser
portador de TDAH é relativamente recente. Os critérios diagnósticos são
similares aos da infância, e o tratamento envolve abordagens
medicamentosas e psicoterápicas.